terça-feira, 16 de dezembro de 2008

A música de Pernambuco pede lugar no Abril pro Rock


“Paulo André, não me ouve/ Paulo André, não me ouve/ Não presta atenção no meu release e CD/ Se eu não tocar no Abril Pro Rock, como vou aparecer na MTV ? “. A letra da música ‘Paulo André não me ouve’, da banda The Playboys retrata bem o desespero das bandas locais em tocar no que é, hoje, um dos maiores festivais de música alternativa (e por que não independente?) do Brasil: o Abril pro Rock.

“The Playboys” fez tanta “zoada” que conseguiu uma chance, oficial, em 2007. Isto porque, em 2005, eles resolveram alugar uma tenda para ‘venda de objetos’ no festival, mas o que mostraram mesmo foi a música do grupo. Conseguiram assim alguma aparição naquela edição. Como? Na ocasião disseram para a organização do APR que levariam uma caixa acústica para expor alguns instrumentos de brinquedos que estariam vendendo. Mas exibiram muito mais. Apresentaram música. De improviso, fizeram um pocket-show com a participação especial do roqueiro gaúcho Wander Wildner. E Paulo André os ouviu...

Zé, ex-integrante da The Playboys, fala que a idéia da música em “homenagem” ao produtor do APR, foi do baixista Ebis Filho. O convite no ano passado, “foi quase uma bandeira branca do festival, pra gente, com um show no Palco 3”, afirma Ebis.

O caso da banda pode ter sido como uma resposta à perda de espaço que o APR vem proporcionando às bandas independentes de Recife? Talvez. O Abril surgiu com o objetivo de divulgar e apoiar os grupos pernambucanos que estavam começando no cenário musical. Houve um progresso significativo ao longo dos anos. Mas nem sempre uma evolução agrada a todos. As bandas de rock do estado estão se queixando por, supostamente, estarem perdendo lugar para outras, nacionais e internacionais. Afinal de contas, o Abril virou um dos maiores festivais do Brasil.

A independência é conhecida como um trabalho difícil no ramo fonográfico. Manter um grupo independente hoje, não só em Pernambuco, mas no Brasil, é uma missão árdua para muitos e gratificante para pouquíssimos. A vocalista Iana Reckman e o guitarrista, Marcelo Pompi, da pernambucaníssima Carfax, conhecem bem essa história. Tendo 80% dos componentes da banda sobrevivendo exclusivamente da música, Iana conta que a dificuldade financeira existe e a ausência de incentivo cultural também. Para ela, faltam mais rádios dispostas a divulgar as bandas locais, principalmente de rock. Dependem de toda uma conjuntura de condições, para que músicos autônomos apareçam e permaneçam no meio, usufruindo financeiramente dessa arte. “Pernambuco tem o ‘produto’, uma música muito boa e consumida no mundo inteiro. Só o próprio estado que ainda não enxergou isso”, comenta Marcelo, referindo-se aos investidores de entretenimento. Outro ponto é discutido por Iana: a reafirmação das bandas no festival. “Artistas que passaram pelo Abril Pro Rock não repetiram o feito e garanto que não foi por conta de não terem ‘expandido’ seu trabalho. Justamente quando o festival se fazia mais necessário para consolidar a ‘continuidade’ desse pessoal aqui, não rolou!”, esclarece a vocalista.

Para estimular e dar espaço para os iniciantes, alguns locais servem como uma verdadeira vitrine. Um deles é o bar Burburinho, no Bairro do Recife. Anésio Júnior, produtor do local, fala que é necessário criar incentivo na cidade, que considera um lugar limitado no quesito “espaços para grupos novos”. “É importante cultivar esse caráter de apoiar a música da região, mesmo correndo o risco e apostando o negócio em músicos que ainda estão começando”, ressalta. “Provavelmente em julho, estaremos selecionando bandas para tocar com outras já conhecidas, aquelas que já tenham até fãs. As pessoas irão ver os artistas que estão em ascensão e, assim, as independentes contarão com a mesma platéia”, comenta o proprietário da casa, Fernando Ribeiro.

O raciocínio parece ser o mesmo utilizado no Abril pro Rock, na opinião de Glauber Lemos, fã da música pernambucana, mas bem crítico nos comentários. “Eu rezo para ouvir mais autenticidade. Algo mais do que os sambinhas sem sal de bandas como Mombojó e Eddie”, ataca. Ele acredita que o festival quer criar ‘novas roupagens’ em seu estilo e acaba por se esquecer do que realmente o fez: as bandas locais. “Os iniciantes e independentes querem tocar, querem fazer público, e essa é a melhor ajuda que qualquer banda no início da carreira pode ter”, assegura. Glauber acredita que a presença de grandes atrações, de relevância nacional e até internacional, são positivas, pois atrai a curiosidade das pessoas que acabam vendo as apresentações dos grupos “menores”. “Acho que uma boa combinação. O encontro de bandas ‘grandes’ e autônomas é a melhor saída, contanto que privilegie as locais, podendo cumprir muito bem o papel de atrações principais do festival”, conclui Glauber.

Desde o começo de suas edições, o Abril pro Rock tem servido como grande vitrine para toda essa movimentação cultural que acontece na cidade. Ele joga ao público bandas antes desconhecidas, que acabam se tornando prediletas da audiência jovem. O festival faz mais que isso. Bate nas portas do cenário musical e apresenta o novo. Escancara os ouvidos de quem se acomoda com o que é mais ‘indicado’ pela mídia. O Abril abre. E é Pernambuco quem pede passagem.